Com performance impressionante de Kristen Stewart, Spencer chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (27)
“Gosta que fiquem bravos com você?”. É assim que Diana Frances Spencer é questionada logo no início de Spencer. A indagação já dá o tom para o que acompanhamos ao longo de todo o filme: uma Princesa de Gales marcada pelo incômodo. Este incômodo que vem da Família Real britânica, a qual faz de tudo e ultrapassa o absurdo para mantê-la sobre as rédeas, mas, principalmente, um incômodo insuportável vindo da própria Diana, que está sufocada diante de um relacionamento fadado a acabar - mas ainda sendo obrigada a viver sob as aparências da realeza.
E uma coisa é viver no limite, mas o longa dirigido por Pablo Larrain (Jackie) que chega aos cinemas em 27 de janeiro consegue explorar as circunstâncias de alguém que já atingiu esse limite há um bom tempo - e agora está prestes a desabar. Quem encara o desafio de interpretar Diana neste mix de sentimentos é Kristen Stewart, que surpreende não só nas semelhanças vindas da caracterização, mas também em uma atuação que mergulha nesta confusão e impressiona o público.
Apesar de apresentar outros nomes de peso no elenco como Jack Farthing (Príncipe Charles), Sally Hawkins (Princesa Margaret) e Stella Gonet (Rainha Elizabeth II), Spencer não se propõe a expor a perspectiva de diversos membros da realeza sobre este momento emblemático da Família Real, assim como outras produções já se arriscaram. Felizmente, é Stewart quem ganha o maior tempo de tela e quem realmente comanda o filme, representando a experiência pessoal de Lady Di como uma mãe e uma mulher com seus desejos próprios reprimidos.
A novidade é ambientada na Sandringham House, casa de campo da Família Real, durante o feriado do Natal de 1991 - as últimas festividades que Diana passou com a realeza antes de se separar de Charles. É neste espaço em que acompanhamos os acontecimentos retratados do que o próprio filme adverte em sua abertura, de que esta é “uma fábula de uma tragédia real”.
O projeto apresenta algumas das tradições que a Família Real tem neste período, como o costume de se pesar antes e depois do feriado do Natal e as diversas refeições que os familiares precisam frequentar em horários fixos. Além de contextualizar o público sobre alguns destes hábitos rígidos, tais artifícios também funcionam para expor o sufoco intenso de Diana diante das regras que é obrigada a seguir.
Essas diretrizes agravavam não só a má relação que a Princesa tinha com a realeza na época pré-divórcio, como outros problemas pessoais que marcaram sua trajetória: transtornos alimentares. Em diversas cenas, o foco é direcionado para a retratação de Stewart sobre a bulimia de Diana - inclusive, fica aqui um alerta de gatilho, pois alguns destes momentos são bem intensos.
Dessa maneira, o longa se propõe a apresentar um paralelo que destaca a rigidez dos procedimentos da corte lado a lado com com rigidez da situação que Lady Di se encontra. Ao mesmo tempo em que acompanhamos a exuberância de comidas, também vemos Diana sendo abandonada e desdenhada pelos familiares. Ao passo que somos apresentados à diversidade de alimentos (que posteriormente são até desperdiçados), vemos Charles destratando a então esposa e depreciando seus transtornos alimentares.
A trilha sonora é um dos mecanismos utilizados para intensificar esses extremos em que vemos a protagonista se colocando em situações desesperadoras. O filme faz um bom trabalho ao intensificar sons pesados e angustiantes em cenas que Diana, por exemplo, está aflita com a necessidade de se alimentar e ainda ressentida das traições do marido com Camila, Duquesa da Cornualha - que também é apresentada brevemente na produção.
Esta situação específica do longa retrata muito bem a importância da sonoridade na produção: quando Lady Di presencia um delírio e agoniza a ponto de comer as pérolas do próprio colar, jóia que é colocada como uma espécie de coleira que a personagem precisa utilizar. Não só tal cena apresenta extrema importância para a produção, como a atuação de Kristen também impacta demais.
Entre outros devaneios que Diana vive no filme, também está sua constante comparação com Ana Bolena, mãe de Elizabeth I e segunda esposa do Henrique VIII, que foi executada dias após a anulação de seu casamento com o rei. Sozinha em meio às pressões que sofre pela família real e incapacitada de seguir seu rumo desejado, a história de Bolena funciona como uma espécie de conforto para a situação em que a Princesa se encontra.
A solidão de Diana também é muito bem explorada, já que dentro da propriedade real, ela é condenada a viver limitada, passando o sentimento de estar em uma prisão. Já quando é exposta diante do público, ela é constantemente atormentada por fotógrafos e pela mídia. Contudo, o filme mostra como Lady Di encontra um ponto que mantém seu equilíbrio: os filhos.
Apesar dos diversos problemas tensos com a família real que também sufocam os espectadores, quando somos apresentados à maternidade de Diana, conseguimos acompanhar uma atuação de Stewart mais leve e feliz com a presença dessa família próxima. Situações como estas são expostas em pequenos detalhes que suavizam a trama, como em cenas em que a personagem se esquiva de obrigatoriedades e apenas brinca descontraidamente com Harry e William.
Explorar estas complexidades de uma figura tão célebre como Diana é um grande desafio, mas o longa acerta ao destacar a constante balança presente entre a vida pessoal e pública da Princesa: de um lado a repressão que sofre dentro da realeza e de outro seus filhos como o maior motivo para não desabar de vez e continuar lutando.
O primeiro LIVE IS DEAD! de 2022 está entre nós & com um tema que a gente simplesmente ama: BLIND ITEMS (ou FOFOCA ÀS CEGAS, em uma tradução livre HFTV)